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Pense como seria...
Se em algumas verdades houvesse mentiras
E se todas as mentiras em algum momento não fossem de verdade
Pense como seria.

Pense como seria...
Se em um mundo de águas as lágrimas não brotassem de uma amargura da alma
E se a alma virasse sertão, onde choveria, mesmo que em mínima pluviosidade,
as lágrimas da felicidade
Pense como seria.

Pense como seria...
Se em dias que se entedia, se estendia o dia
e ao homem em um jardim, viesse a privação de uma rosa que tendia
E para a rosa, em um só jardim, minguasse a admiração de um único olhar do homem
Pense como seria.

Pense como seria...
Se existisse razão em um sorriso
E se para um sorriso necessitasse a existência de uma razão
Pense como seria.

Pense como seria...
Se no medo da incerteza, não tivesse intrínseco a certeza do medo
e se no medo de se estar certo, não ocorresse a incerteza de se errar
Pense como seria.

Pense como seria...
se o tempo em determinado momento se esgota
como seria se não existisse reticências
Pense como seria...

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... na rua Maria erguia seu prato. tinha olhos desdentados e rugas secas das lágrimas que há anos não chovia, nem de tristeza, nem de alegria... ao vê-la, imaginei Maria, mariazinha... a vi brincando menina, correndo sem o peso do amanhã nos seus ombros. dentro, mariazinha se escondia atrás do coração de Maria, rezando para que alguém afastasse as moscas que pousavam no corpo dela. qualquer alguém... ali, Maria nascia e crescia tão rapidamente como lentamente morria... tornou-se uma paisagem naturalmente pintada pelos homens, como a figura de Cristo tatuada ao redor do próprio umbigo... anos mais tarde, Maria ainda sobrevivia por ali, pintando de negro a asa branca, dormindo sobre as flores de Geraldo Vandré e perdendo o trem das onze, com o que lhe sobrava, restava apenas sentar-se no chão para ver a banda passar... tanta miséria agasalhava Maria. tantos nãos a nutria. mesmo assim, quase alcancei mariazinha quando me estendeu sua mão enquanto Maria me agradecia. podres esperanças exalavam de Maria. vida vencida. mas a maioria das pessoas que passavam não sentiam, ou melhor, não queriam. muitos nem viam Maria ali sentada. calada. miudinha. no prato algumas moedas no lugar de comida. não seria eu se não fosse Maria. era Maria. eu sei que era Maria. mas poderia ser meu pai, minha filha. poderia ser você, João, Ana, Cecilia... um ou outro jornalista escrevia sobre quantos quilos da vida daquilo cabiam em um só olhar, já outros, os de gravatas, mediam mesmo a vida de Maria em colherinhas de chá... esta Maria, rainha do quinto naipe do baralho, não era Maria de poesia. era de agonia. não por ser ela tão velha. tão indefesa. sozinha... mas por ser somente Maria.

Grandes inventores, artistas, civilizações,
pensadores e deuses...
Suas máquinas, obras, estilos e culturas, dogmas, idéias e crenças
Quando atingem a perfeição,
Depois de pompuoso frenesi
Decaem obsoletos no cemitério dos suplantados.

Oh! Raça humana, implore a Deus
que nunca alcance o requinte em sua criação
E Deus,
Sempre há de permitir o livre arbítrio
Garantindo eternamente, assim,
O que nos reparar.

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desejo a você

que todos os dias abra os olhos antes de acordar,
o lado negro da lua não inspira poetas
e nem leva aos olhos da alma o cheiro doce do amanhecer...
que abra os braços mais vezes,
mesmo de mãos atadas, mesmo cansado, no chão...
abra os braços mais vezes
porque a vida é carente de atenção, às vezes,
precisará desacreditar nas pessoas
para poder acreditar em si mesmo e, por fim,
jamais duvide da força do seu sorriso
e do amor do seu pai...

... o tempo lentamente transformava em arte a vida dela em mim...
como se arte não fosse meramente mistura de tristeza com alegria, mas sim,
algo entre o sonho e a realidade...

para D.G.

... meu erro foi tecê-la em metáforas...
e ter enxergado não nos seus olhos, por exemplo, o azul do mar,
mas sim no azul do mar os seus olhos...
por isso, ei de tê-la eterna comigo,
no pensamento e coração...
e os meus sentidos, que são alheios ao meu pensar,
irão te reconhecer a cada instante da vida...
pois a natureza haverá de me presentear,
estando eu alegre ou triste,
sempre...
... com uma nova paisagem-você...

Eu observo seu vestido rodado, bailando rápido, como o peão da vida
Eu vejo seu sorriso se abrindo tranqüilo e cumprido como o beijo dos enamorados ou como o sol ascendendo o dia depois de uma noite de lua cheia...

O que temos para fazer hoje?

Já chega!

Traga a verdade pura embrulhada em olhos de celofane
Qual o caminho a percorrer para desvendar os confins da noite?

O crucifixo do caráter queima a pele atordoada no ventre impuro
Da ladra de almas
O único pagamento pelos pecados é a morte
A dor bem vivida traz a liberdade saqueadora das aves de rapina
A boca arqueada deixa minar o veneno adocicado
Palavras peçonhentas da paixão

Credos e sinas para os que acreditam que podem comprar sentimentos
Em qualquer esquina
Senhoras em rugas chorando, seus filhos famintos esperando
Casas transformadas em currais, almas livres confinadas
Famílias de um só indivíduo
Nas cadeiras, poderosos satiros com suas mãos de martelo
Nas cadeias jovens marionetesE apinhados em asilos, antigos fantoches esquecidos

Palhaços virginais têm fome de felicidade
Em qualquer semáforo, políticos-flanelinhas lunáticos
E esmiuçando as praças como belos pivetes
POETAS EMPUNHANDO CANIVETES!
Basta!

O dia desperta aflito como um grito sem direção
Como um suicida na beira do abismo ou um tiro certo ao coração
Como alguém que no labirinto se perde e pede ajuda levantando as mãos
Como o ombro ausente do melhor amigo na esperança contida de uma oração
Como o desejo que alimenta o vício e corre nas veias em procissão
Como a busca de um homem sozinho por entre tantos outros que estão
Como a paz no deserto tão perto para uma morte sem explicação
Como o ar para o recém nascido ou o amor ao Grande Irmão
O dia adormece tranquilo e segue a vida sem perdão
.

... o amor é um barco sem velas a se esquecer no mar...



São tantas pessoas estranhas
Para se estender as mãos
Uma solidão que não descansa
Que infesta
Sem festa
Que lasca devagar
A casca mole da alegria
Que expõe o cerne humano
De textura azulada, como pão embolorado.

Seria confortável e animador
Se para cada um de nós existisse um cão faminto
E devora,(dor)... a nos farejar.


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